Dr Eduardo Adnet


Médico Psiquiatra e Nutrólogo

 

Esquizofrenia Paranóide

 


Certa vez fui chamado a atender um paciente em sua residência. Sua mãe já havia tentado diversos modos de conseguir tratamento para seu filho, todos sem sucesso. Ao chegar à casa do indivíduo (ainda não o chamava de paciente, pois ainda não o conhecia, senão pelo relato de terceiros) observei que toda a casa se encontrava fechada, tudo trancado e o homem não atendia a porta por nada. Presentes eu, sua mãe e familiares, tentamos, em vão, que o rapaz abrisse a porta. E mesmo a despeito de todos os esforços de sua mãe, ninguém conseguiu entrar (o indivíduo era maior de idade).

Passada uma semana, a pedido dos familiares, retornei à residência do rapaz, na presença de seus familiares e, finalmente, ele concordou em me receber. Abriu-me a porta e logo a seguir correu e se trancou num quarto da casa.

Logo ao entrar em sua casa, duas coisas, imediatamente, me chamaram a atenção. Primeiro: havia comida esparramada pela cozinha e parte dela em decomposição. Segundo: um rádio todo quebrado e cercado de diversas ferramentas.

Não foi nada fácil conseguir que o rapaz abrisse a porta do quarto onde estava, mesmo na presença de sua própria mãe. Passado algum tempo, ele finalmente aceitou conversar comigo.

Seu olhar era hipervigilante, sua atitude inquieta, barba por fazer, desleixo evidente com os cuidados pessoais e uma atitude mesclada de suspeição e de grande desconfiança.

Após ter me apresentado, indaguei se ele necessitava de algo, se estava se sentindo bem, enfim, se eu lhe poderia ser útil em alguma coisa.

Sempre com ares de desconfiança, apresentou-me um discurso confuso, carente de coerência, todavia com ênfase de relatos. Perguntei se estava com fome e indaguei sobre a comida esparramada por toda a cozinha, sacos de comida abertos, outros fechados, alimentos em decomposição. Seu relato foi mais ou menos o seguinte:

“Não posso me alimentar bem. Nem que eu queira. Não posso sair e ir ao mercado pra comprar nada porque a polícia e os bandidos estão me perseguindo. Eu sei de tudo. Estão em combinação contra mim. Eles querem me matar!”

Então eu perguntei por que não podia ir ao mercado.

“Eles estão me perseguindo. Eles sabem a hora em que eu vou ao mercado e já sabem qual o saco de feijão que eu vou pegar na prateleira. Se eu for, antes que eu pegue o saco de feijão, eles pegam o saco que eu ia escolher e enchem o saco de veneno. A polícia e os bandidos. Eles já sabem. Não posso comprar nada no mercado, senão morro envenenado.”

Em seguida, indaguei sobre o rádio quebrado e sobre as ferramentas à volta do rádio.

“Eu fui no hospital e o médico me disse que eu precisava de uma lavagem de ouvido. Quando ele foi lavar meu ouvido, usou uma seringa grande e colocou um chip dentro do meu ouvido. O chip escorregou do ouvido e foi pro meu nariz e está preso aqui dentro. E se eu ligar o rádio, eu sei que tem uma estação que sintoniza com o chip e transmite tudo o que eu estou pensando para todo mundo que estiver escutando a rádio. Não são todas as rádios que sintonizam com o chip que está no meu nariz, mas é uma rádio que eu conheço. Tenho que consertar isso.”

E isso explicava o rádio quebrado e as ferramentas à sua volta.

Este paciente também, em diversas noites, ao sair para a frente de sua casa pensava que os reflexos dos carros nos vidros das janelas vizinhas eram luzes de sirenes de carros de polícia que estavam vindo para lhe prender.

Bastou que este paciente iniciasse o uso da medicação prescrita e já evidenciava uma significativa melhora.

Este foi um dos diversos casos clássicos de Esquizofrenia Paranóide que atendi.

Definição de Esquizofrenia Paranóide pela Classificação Internacional de Doenças - CID

“A esquizofrenia paranóide se caracteriza essencialmente pela presença de idéias delirantes relativamente estáveis, freqüentemente de perseguição, em geral acompanhadas de alucinações, particularmente auditivas e de perturbações das percepções. As perturbações do afeto, da vontade, da linguagem e os sintomas catatônicos, estão ausentes, ou são relativamente discretos.” (Classificação Internacional de Doenças - CID 10)

 

 

Dr Eduardo Adnet

Médico Psiquiatra e Nutrólogo